Educadores têm sempre sérias dúvidas sobre o quanto conceder ou cercear liberdades aos jovens em formação. Olhando o recente descontrole de alguns estudantes da USP que a tudo recusam, inclusive o cumprimento de uma decisão retirada de assembléia da própria classe; e vendo que, embora sejam representantes de classes privilegiadas, aquelas que têm acesso ao ensino de alta qualidade pago pelos impostos de todos, cobrem o rosto como se estivessem à margem, o impasse parece imenso. José Pacheco, idealizador e coordenador da escola portuguesa da Ponte, reconhecida em todo o mundo pelo projeto educativo inovador, fortemente estruturado na autonomia dos estudantes, declara constantemente que muito cedo seu grupo de professores compreendeu que “precisavam mais de interrogações que de certezas”, e empreendeu um caminho feito de alguns pequenos êxitos e de muitos erros, dos quais continuam a colher ensinamentos, para garantir oportunidades educacionais e realização pessoal para seus alunos. A discussão sobre autonomia é imperativa; no Brasil praticamente todas as escolas, tanto públicas quanto privadas, funcionam em uma lógica administrativa e burocrática, e poucas tem se pautado, efetivamente, por um norteamento pedagógico, embora este esteja presente em discurso – principalmente no midiático – da grande maioria delas. Autonomia é considerada condição fundamental para a inovação e o empreendedorismo, temas tão caros ao ensino hoje em dia, contudo, o quanto desta é possível ou desejável, aos alunos, funcionários e professores, está longe de consenso. A maior parte dos gestores de todos os tipos de organizações, incluídas as educacionais, é formada em escolas cujos administradores são centralizadores, e aquilo que aprenderam na prática cotidiana, quando seus educadores não estavam conscientes de ministrar uma aula, talvez seja a mais completa lição possível de ser oferecida à sociedade como um todo. O dilema entre controlar ou conceder liberdade criativa é conhecido por todos os professores na condução de seus alunos, pois perder o controle sobre crianças ou adolescentes, numa sala contendo dezenas deles, pode ter consequências imprevisíveis. Assim, a concessão de autonomia deveria ser feita dentro de certos limites; todavia, pela extrema dificuldade em defini-los, a tendência será restringir ao máximo o livre-arbítrio, garantindo a ordem e a disciplina, o que facilita, mas nem sempre permite atingir objetivos. Escolas formam quadros para a sociedade, estão em íntimo contato com o mercado e com a sociedade civil organizada, e, numa democracia, a compreensão das metas educativas envolve a ética, tanto da escola quanto do docente e discente. Sem autonomia, existirão simples cumpridores de ordens, automaticamente isentos de responsabilidade, meros prestadores de serviço num ambiente que muitas vezes será autoritário e opressor. No entanto, como ignorância exige menos esforço e dedicação, certa governabilidade beneficia o ato educativo, civilização implica, sim, em delimitar o selvagem que está sempre à espreita dentro de cada um; desregrados e rebeldes raramente são felizes ou produtivos, embora, como toda regra, esta também tenha suas exceções. No ensino universitário, a questão da autonomia é ainda mais crítica, o conflito entre enquadrar-se às regras da obediência e subordinação, ou procurar a qualidade de ensino através da inovação, é urgente. Isso demanda reflexão e trabalho, pois, a decisão do quanto de liberdade para a manifestação da competência é possível ou desejável é tarefa imensamente complexa. Uma escola está sempre relatando o passado, o já feito, o anteriormente descoberto; porém, ao mesmo tempo, como lugar de diversidade, apontando o futuro, o novo, o inesperado. Ampliar ou reduzir autonomia estará sempre no cerne do conflito educacional, já que, lembrando Rousseau, “o princípio inspirador do pensamento democrático é a liberdade, compreendida como autonomia”. *Wanda Camargo, educadora e presidente da Comissão do Processo Seletivo das Faculdades Integradas do Brasil - UniBrasil. |
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
Autonomia ou controle?
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